sexta-feira, fevereiro 3

 

Quando for grande quero ser como o João Pedro George

É essa a verdade: quando for grande quero ser como o João Pedro George. O obstáculo que se me coloca é escolher as obras sobre as quais verterei o meu fel, depois as leis do determinismo físico tomarão conta de mim e tudo acontecerá naturalmente. Se por acaso me apanharem a tecer rasgados elogios a uma das minhas vítimas não de iludam! Será apenas com o fito de mostrar o cuidado que ponho na sua escolha.

O naco de prosa a que hoje me vou dedicar é uma carta extraída da correspondência sentimental de uma das nossas leitoras (sem link) datada de 20 de Janeiro de 1996. Trata-se de um exemplar raro, portanto. Devo dizer que os meus pais, antes do seu casamento, no ido Verão-quente-de-75, mantiveram um romance epistolar. Como diria a minha avó isso foi na altura da "maluqueira". Isto, há trinta anos. Ora, a raridade do exemplar que estudamos hoje deriva justamente da escolha, em pelno ano de 96, da epistola para comunicar o sentimento amoroso. Vale a pena lembrar que na altura, em meio urbano, não era de todo invulgar o uso de telemovel. A escolha da epistola revela-se acertada - o desdém da destinatária pelo uso da mensagem curta como expressão romantica é do domínio público.

Ora, dizia eu, o uso de epístola é um claro sinal da influência de Platão sobre o nosso autor. De resto o próprio texto da carta é claro a esse respeito. Por um lado o autor refere o anterior evio de um postal ilustrado, mas mais significativo é o terceiro parágrafo da obra em apreço "Serás sempre o meu amor mesmo quando saires da nossa escola." Querem prova mais directa da tese aqui apresentada?!

Mas o platonismo não é senão uma manta curta - por de trás das ideias puras da caverna platónica esconde-se a dura realidade quotidiana da relação objectal.

Voltemos a analisar a frase. "Serás sempre o meu amor mesmo quando saires da nossa escola." O autor faz uma paráfrase dos votos matrimoniais católicos (provavelmente inconsciente). Aqui não é a morte que apartará do nosso autor a sua amada, mas sim o progresso académico desta última. É tentador supor que o progresso académico da destinatária da nossa carta era mais célere do que o do nosso autor, apesar do óbvio interesse dela pelo futebol e pelo ping-pong. Um drama diário nas sociedades contemporâneas.

Exploremos outras possibilidades de análise. Outra possibilidade plausível (o quê, não vos chega este adjectivo?!) é a possibilidade de uma diferença etária que, mais tarde ou mais cedo, forçaria o afastamento dos potenciais amantes. É todo um programa que se estende inexplorado à nossa frente! Há a reter que a destinatária da carta tinha na altura 11 anos, significa isto que na hipótese da diferença etária estamos perante uma criança que se enamorou por uma rapariga na puberdade, o motivo será provavelmente a curiosidades masculina peranta a sexualidade feminina que ali desponta.

[Desculpa, ter-me apoderado do teu espólio, para escrever um post tão autobiográfico, mas a projecção é o mecanismo mais eficiente para lidar com a "dura realidade quotidiana" "que se esconde por de trás das ideias puras da caverna platónica".]

Comments:
adorei! =)
 
LOL
 
Enviar um comentário



<< Home

This page is powered by Blogger. Isn't yours?

my stats